Aos 29 anos recebi no meu coração e ventre
o convite à Maternidade. Esse foi, sem duvida alguma, o melhor convite da Vida!
Foram muitos anos de preparo: fiz muitas
limpezas espirituais, liberando meu feminino das dores das desistências e
perdas antigas; limpezas emocionais, curando minha criança abandonada e ferida -
a filha que queriam que eu fosse - permitindo que a criança que eu sou
ressurgisse. E limpezas
familiares.... nossa! Estas seguem e seguem acontecendo....
Em Agosto de 2012, lá estava pulsando no
meu ventre o coraçãozinho potente da minha filha amada!
Sempre soube que teria uma menina. Mas,
diante da luz da existência habitando meu ventre me senti MÃE, e como mãe comecei
a me preparar e me abrir para o presente do divino! E esse presente poderia ser
um menino! Um pouco de inquietude veio. Se fosse um menino iria recebê-lo com
todo amor assim como a menina, pois nunca tive preferência. Eu somente sabia
que viria uma menina por há tempos ela me acompanhar. E o Pai também sempre
sentiu que teria uma filha. Nossas intuições casavam, mas também tínhamos a
plenitude de receber a quem nos escolhera.
Nossos amigos todos diziam “Nossa! Que
energia forte! É um menino!”. Apenas o Professor Paulo colocou a mão na minha
barriga e disse: “Que linda! É uma menina!”. E então veio a confirmação de que uma
linda menina se formava em meu ventre!
Quando eu estava com 3 meses de gestação fui
com meu marido no Sitio do Nenel para uma vivência de Biodança e no meio da
jornada, durante uma meditação, minha filha veio e me disse: “mamãe eu sou a
Pietra!”. Naquele momento ainda não tínhamos a confirmação do sexo, mas já
tínhamos 2 nomes caso fosse menina: Yasmim- que eu sempre quis - e Pietra - o
que ela nos falou. Assim que o sexo do bebê foi confirmado, o Papai decidiu: “É
a Pietra!”. Mais tarde, num sonho, ela disse: “Pietra, pois sou um cristal
lapidado no número Pi!”.
Junto com a gestação eu estava passando
por outro processo com minha Mãe. Quando engravidei, minha Mãe fez por uma
cirurgia de retirada de um câncer de mama. Ali se iniciava um forte processo de
depuração da Alma dela e uma profunda cura no feminino da família.
Os 9 lindos meses de gestação se passaram
me dando a oportunidade de sentir a Pietra crescer no meu ventre. Era o milagre
da vida se realizando! Ela gostava de mexer para o pai dela, e só pra ele! Nos
fortalecemos como casal, e uma mulher selvagem brotava em mim.
Era chegada a nossa hora de dar a Luz! Ao
meio dia a bolsa rompeu. Eu estava em casa na melhor companhia do amor e
cumplicidade de meu Parceiro Divino. E ali foram 4 horas de dança, risadas,
meditações, comilança - pois eu tinha muita fome! A cada contração – “Shuaaaaa!!!”.
Um pouco de liquido descia pelas pernas. A água ia abrindo caminho para a Pietra
chegar!
Até que decidimos ir ao hospital, pois era
sexta-feria e havia bastante transito de Canoas à Porto Alegre. No caminho de
ida ao hospital ainda pegamos uma blitz e eu estava com contrações de 5 em
5min!
Chegando no hospital os enfermeiros se
espantaram quando eu disse que estava em trabalho de parto! Senti que não
sabiam o que fazer comigo! Me trouxeram uma maca e eu disse: “Estou bem! Quero
ir caminhando!”. Mas subimos de cadeira para eles ficarem mais tranquilos.
Lá na sala de parto encontrei as fadas do
Parto! Nossa Doula Fabi, que foi uma presença iluminada, junto com a Obstetra
Ana, com sua preciosa presença sábia. Segui
nosso ritmo: dancei com músicas que havia carinhosamente escolhido para este
instante, cantei, me banhei junto com meu Parceiro amado que me acarinhou, me
apoiou e pariu junto comigo.
E o momento esperado chegou! Ganhei minha
filha como minhas ancestrais, de cócoras. Eu mesma peguei-a e coloquei-a no meu
peito! As primeiras palavras que escutou foram “Te amooo filha...” na voz mais linda e doce do
papai e, em seguida na voz da mamãe. Uma alegria imensa surgiu em meu coração,
com força e confiança na vida!
Lá fora as avós aguardavam com todo amor. Conheceram
ela no colinho do Papai de pés descalços! Seu primeiro soninho foi no colo
aconchegante dele.
Minha Mãe foi a guardiã da placenta e
esteve conosco na nossa casa, numa presença divina nos primeiros 10 dias. Estar
com ela foi sublime! Uma cura descomunal para nós duas.
Naqueles primeiros meses a Mãe estava no
seu melhor momento! Linda, cheia de força e garra, ela vinha nos visitar quase
todos os dias. Nos curtimos muito.
Três meses se passaram e o braço operado
da Mãe começou a inchar. Ela vinha em minha casa e eu fazia drenagem pra ela. As
visitas haviam ganhado mais um motivo, mas simbolizavam também mais tempo
juntas e muito carinho. Ali, o câncer já havia aparecido na pele, mas
pensava-se que eram queimaduras da radioterapia. O
diagnostico veio muito tempo depois.
Um dia eu e Pietra fomos visitar a vovó e
ela estava com muita dor, acamada. Convidei-a para passar uns tempos conosco
até melhorar. Ela veio e ficou 40 dias em nossa casa.
Comecei a Maternar minha Mãe. Longas
jornadas de cuidados com as feridas que cresciam rapidamente, causando dores,
queimação e coceira intermináveis. Ela, com toda calma e paciência, sem queixas,
buscava todas as alternativas para a cura. Minha jornada dupla de cuidados se
iniciava: minha filha com 4 meses, cheia de vida, e minha Mãe, com 57 anos,
numa depuração profunda!
A vida me convidou à Maternidade e essa me
levou a viver a profundidade da dedicação ao outro. Morte e vida se encontraram
na minha casa. O processo da Mãe foi se agravando. Cada novo dia, quando
eu descia as escadas, pensava em como iria encontrá-la. Muitas vezes aparentava
já ter partido. Então eu dava um beijinho em sua testa para acorda-la e me
certificar de sua presença. Quarenta dias se passaram e, após o
resultado de uma tomografia, o hospital pediu para que ela fosse internada com
urgência, pois estava com liquido nos pulmões. Fizeram o procedimento e lá ela
ficou por 8 dias. Retornou, dessa vez, para sua própria casa.
Começava, então, uma nova jornada. Quando
ela voltou do hospital sentiu-se mais disposta, com um pouco de vigor. Comecei
a visita-la quase todos os dias. Eu chegava por volta das 10h, fazia almoço pra
nos três ( Avó- Filha - Neta), passava agradáveis tardes de muitas conversas,
revelações e ensinamentos, e por volta das 17h eu e a Pietra voltávamos para
casa. Os meses foram passando, vários tratamentos foram realizados, as dores
aumentaram, e a mãe foi ficando cada vez mais debilitada. Nossa assistência era
cada dia maior. Meu irmão e irmã iam se revezando comigo, assim como algumas
irmãs da Mãe. Em dezembro ela já não podia ficar sem zelo constante.
Por todo este tempo a Pietra, amadinha, foi
uma grande companheira: sempre com um sorriso lindo pra Vovó, minha pequena adorava
ficar na rede se embalando com ela.
No início de Janeiro eu já estava exausta.
Minha filha estava querendo engatinhar, curtir a vida, e minha mãe estava na cama
exigindo cuidados permanentes. Eu já não conseguia mais atender as duas com a
disponibilidade e carinho plenos: uma ou outra, em certos momentos, ficava com
minha ausência! É claro que nesse momento minha filha sempre foi a escolhida em
primeiro plano, pois ela dependia de minha atenção e dedicação plenas.
Eu já estava há 6 meses nessa doação dupla
quando o cansaço começou a chegar: a vontade de curtir a Pietra neste momento
lindo de descobertas, e eu
privando seu caminho a um quarto. Entrei em
conflito interno! O que vem primeiro: Filha ou Mãe? Eu já não estava mais
levando essa situação com harmonia.
Decidi dar um tempo e fui visitar uma
grande e sábia Amiga que mora em um sítio. Sua casa fica encima de uma
cachoeira!!! Lá, me reconectei com meu coração, ajustei meus espaços internos,
desfrutei das bênçãos da maternidade, comunguei com a natureza e nas águas da
cachoeira perdoei minha Mãe e libertei minha filha! Uma coruja voou em meus
pensamentos levando essa mensagem!
Naquele dia liguei para minha Mãe e disse:
“Mãe, nós somos Mulheres Livres!”
Ela estava agora sendo cuidada pela minha
irmã. Incansavelmente, assim como eu havia feito, segundo as palavras da Mãe.
Três dias depois, no primeiro de fevereiro,
ela foi internada novamente. Retornei e durante toda a viagem vim me recordando
de sua beleza. Rios de lágrimas me
acompanharam e cheguei para me despedir dela. Quando a encontrei na emergência,
fui recebida com um lindo sorriso e um abraço carinhoso
pleno de amor. Infelizmente, já havia muita perturbação na mente dela e a
dificuldade para respirar era imensa. Neste dia ela foi entubada. No dia seguinte
fui visitá-la e a vi ao lado de seu corpo. Lágrimas em silêncio correram pelo
meu rosto. Acarinhei seu corpo e beijei seus pés. Muitos da família foram ao
hospital para vê-la.
Mais um dia de hospital se passou e, para
grande surpresa de todos, ela havia se extubado sozinha! Acordou com um
sorriso, dando bom dia a todos do plantão da emergência e dizendo que estava
bem. Falou para o médico: “Doutor, quando tu sentes no teu coração que precisa
fazer algo, tu tens que fazer!”. Ela se referia a fato de ela mesma ter
arrancado os tubos. Ela nos contou que estava caminhando num caminho lindo de
rochas, viu um corpo com um lençol no chão, não reconheceu e seguiu caminhando. Passou por um
jardim lindo, muito florido, e acordou no hospital. Ela estava muito serena
quando a vi naquele dia.
Para minha surpresa. me deparei com uma
situação muito nova! Eu estava preparada para a passagem dela, mas não
imaginava que ela iria ressuscitar! Um turbilhão de emoções corria pelo meu
corpo. O médico que a entubou chamou os filhos dela e explicou que o ocorrido
era quase um milagre, e que não se tinha ideia do que viria: se ela se manteria
ou se iria saturar novamente. Nesse momento o câncer já havia abraçado todo o
tórax e muitos órgãos. O desgaste físico era imenso. Ver o corpo se deteriorar,
praticamente se auto-consumindo, era irreconhecível. Eu, a
Pietra e meus dois irmãos estávamos sem palavras na frente do hospital, apenas
muito surpresos com a força e a imensa vontade de viver da Mãe, que foi e quis
voltar mesmo que para um corpo tão sofrido! Talvez algumas inquietudes da alma
precisavam ser sanadas para que a paz chegasse em plenitude ao coração dela. Nesse
mesmo momento o médico nos chamou na porta do Hospital e com muito carinho
explicou a situação. Ele nos fez uma pergunta: explicou que diante do quadro
dela, a orientação da equipe da oncologia era de não tomar medidas de
prolongamento de vida, mas que se ocorresse algo, “o que vocês querem que seja
feito?”. Nós nos vimos diante de uma decisão muito forte. Todos estavam
sofrendo muito, mas a Mãe, mesmo com tudo que estava acontecendo, queria viver
com toda a garra que tinha. Então decidimos que fossem tomadas
todas as medidas de prolongamento de vida para que ela tivesse o tempo que ela
necessitava. Isso porque quando chega a hora da partida, independente de qualquer
coisa que se faça, aquela é a hora e pronto! Somente o coração sabe quando
chega esse momento. E nós, seus filhos, não poderíamos ser egoístas ao ponto de
diminuir nosso desconforto se ela, que estava naquele estado depurativo
profundo, queria, mesmo assim, estar aqui! E por aqui ela ficou mais um mês,
totalmente acamada. Suas irmãs a acompanharam nestes momentos finais. Nos
últimos meses a Mãe esteve sempre acompanhada. Eu fui visitá-la praticamente
todos os dias e para fazer isso eu contei com vários amigos que me deram
suporte. Alguns me levavam ao hospital e ficavam com a Pietra no estacionamento
para que eu pudesse passar um tempinho com a Mãe.
Então, minha bebe já estava com 8 meses e
embora já tivéssemos iniciado a alimentação dela com as comidinhas, o mama é o
preferido. Cerca de 90% da alimentação dela é leite materno. Amo amamentar e
sou grata pela fartura que alimenta minha filha até hoje. Nunca coloquei
horário para as mamadas. Nós duas curtimos muito esse nosso momento e ela mama
quando quer e a todo hora. Uma delicia!
Esse foi um período de muitas revelações. Nestes
momentos as pessoas se revelaram. Amparo e descaso andaram juntos, carinho e
raiva. Houve muitas revelações, vindas de todos os lados. As verdadeiras
parcerias aconteceram. Alguns se dedicaram com amor e outros com dor. Houve
muitos enrolos e desenrolos e, para mim, o que ficou foi a força da Verdade!
Quando a Mãe retornou da entubação,
comecei a meditar no Jardim da Kuan Yin e lá a sua Individualidade apareceu. Linda, ela me
falava as orientações a serem passadas à Mãe. Quando eu ia ao hospital nós
falávamos sobre este espaço que havia para nos encontrarmos e a Mãe acolhia e
realizava com amor cada orientação! Uma destas orientações foi a de colocar
asas em seus pés e nutrir de luz essas asas, pois logo ela andaria em outros em
caminhos.
Mais ou menos 15 dias antes da sua grande
viagem, o Mestre Lanto enviou uma mensagem através do livro dos “7 Chohans”. Nesta
mensagem, entre outras afirmações, ele fala da iluminação, da eternidade e de que
a receberia em seu Templo no caminho das pedras. Aquele mesmo caminho que ela conheceu
quando ficou entubada.
A passagem da Mãe aconteceu numa
quarta-feira, dia do Mestre Lanto, no dia de Isis.
Muitos sinais de iluminação estiveram ao
redor de sua passagem, mas para mim o mais surpreendente aconteceu ao entregar
suas cinzas no mar.
Quando
fui buscar a urna com os restos da cremação, por curiosidade li o atestado da cerimônia.
Alguns dias depois eu sonhei com a Mãe conversando comigo, mas eu não conseguia
escutar o que ela me dizia. Então ela me mostrou várias palavras no certificado
da cremação e estas palavras se misturaram transformando-se em três golfinhos
que giravam. Entendemos que a entrega de suas cinzas à natureza seria no mar.
Então marcamos aleatoriamente um sábado na Praia de Torres, lugar que ela
gostava muito! Lá, uma grande amiga dela nos recebeu num dia agradabilíssimo.
Ela fez um almoço com tudo que a Mãe gostava. Serviu um almoço para mãe com um
lugar para ela na mesa e uma vela amarela, assim como se faz na sua tradição
Ortodoxa. Aos 30 dias de morte da pessoa querida eles realizam um almoço em
homenagem a ela. E exatamente naquele sábado os 30 dias de morte de minha Mãe
se completaram!
Fomos para a praia no momento do pôr-do-sol
para entregar suas cinzas no Portal de Pedras da Praia da Cau. Os raios de sol
iluminavam as ondas. Meu irmão fez as honras de jogar as cinzas. Aplaudimos,
entregamos flores, nos emocionamos e todos começaram a retornar. Eu e
meu companheiro ficamos abraçados olhando mais um pouquinho o mar. Uma canção
veio de meu coração e eu cantei pra ela! Para nossa linda surpresa os golfinhos
aparecerem no mar! Golfinhos estavam lá recebendo e iluminando este instante
sagrado!
Agora tudo mudou. Sou a ponta do meu
triângulo de hereditariedade. Sinto uma profunda força de Luz e Paz que flui em
mim, em minha filha, no meu lar. Cada dia amplia a relação de respeito entre
mim e a Pietra. Maternar é ver todos os dias ela crescer, despertar, fazer
escolhas, descobrir o mundo!
Em muitos instantes reconheço nossos
traços nela e ela, com sua doçura, ilumina minhas sombras, me faz ser cada dia
uma mulher melhor, mais centrada no meu coração, firmando sempre as decisões no
caminho do amor e da harmonia.
Sou grata ao meu Parceiro Divino por me
presentear com a oportunidade de estar com minha filha todos os dias e maternar
tranquila, com seu apoio e cumplicidade em todos os momentos.
Entendo que cabe a nós construir, gerar e manter
nossa célula familiar sadia, amorosa em Paz!
E assim vivemos!
Ana Paula Marafigo
23-4-2013